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jan
Caiçara, santista, pé na areia
Sou santista de nascimento, mas acima de tudo, sou santista de coração. Hoje, essa cidade que ouviu meu primeiro bradar, completa 470 anos. Que alegria e honra celebrar esta data, não só porque realmente amo meu berço, mas porque grande parte minha história foi vivida ali.
Fui a Santos só para nascer, já que meus pais moravam e ainda vivem em Guarujá. Atravessei a balsa, pela primeira vez, com poucos dias de existência. Depois disso, contabilizar às vezes em que deixei a Ilha de Santo Amaro rumo a Santos ficou impossível. Compras, consultas médicas, estudos, trabalhos e diversão. Tudo começou muito cedo.
Tenho eternizadas na memória as brincadeiras nas ruas do Boqueirão, onde viviam meus padrinhos e onde passei algumas férias escolares. Acredito que foi ali que começou minha paixão por árvores. Madrinha vivia numa casa antiga, numa rua bem arborizada. Ali passeávamos e eu corria livre. Divertia-me pegando favas secas direto das árvores, que banhavam o chão com suas folhas minúsculas, colorindo de verde a imensidão já cinza abaixo dos nossos pés.
Fantasiava que essas favas eram feijões mágicos e eu não cansava de pegar, sonhando com as possiblidades de desejos realizados. Até hoje, quando vejo favas penduradas, sinto-me tentada a pegá-las, numa ânsia súbita de voltar no tempo, à Santos da minha infância, onde a pureza era meu bem mais precioso.
Impossível não olhar com doçura para esse e outros tempos além das férias escolares. Fiz cursinho e faculdade em Santos. Vivi paixões, entregas e conheci o preconceito racial. Vivi nas nuvens e levei tapas na cara. Vivi a cultura da cidade, com seus bares e cinemas. Vivi e contei histórias. Quanto da cidade já não percorri, observando, ouvindo, colhendo dados e informações para contar sua história?
Para mim, nascer em Santos não foi suficiente. O orgulho é de vivenciar seus dias, descobrir suas belezas e encantos, conviver com sua gente, participar da cidade, fazer parte da sua história.
Hoje já não atravesso a balsa diariamente, o desafio é cortar cidades para estar na minha cidade. Brinco que sou intermunicipal, passo meus dias entre um lugar e outro, ainda contando histórias. Faço isso com o pé na areia, sentindo o calor do sol e a brisa do mar a renovar meu espírito caiçara. Vivo assim porque sou daqui. Sou de Santos.
Artigo escrito por Flávia Souza,
Diretora de Spiraal Comunicação Inteligente