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jan

Brasil: deixe-o e viva

Que tempos são esses em que estamos vivendo? Um período negro, em que pessoas têm que abandonar o País para, simplesmente, continuar a viver. A vida deveria ser direito constitucional, mas parece não ser. Quantos lutam para criminalizar a mulher que aborta, tendo como justificativa que o feto já é uma vida, mas desejam a morte daqueles que ousam lutar pelo direito das minorias? É inconcebível que um deputado tenha que abandonar o seu cargo, para o qual foi eleito pelo povo (democracia), para poder continuar a viver.
Essa semana lemos que Jean Wyllys, deputado federal eleito pelo PSOL vai deixar o Brasil para poder sentir que vive em paz. Há alguns meses, soubemos que Débora Diniz, professora, pesquisadora e antropóloga premiada, deixou o País para continuar a viver. A luta de Jean foi marcada pelo direito aos LGBTs. A de Débora, pelas mulheres.
Como não lembrar de outra pessoa que não teve tempo para decidir deixar o País: Marielle. Além de lutar pelas mulheres e LGBTs, como Débora e Jean, ela também encampava luta pelos pobres e negros. Ao que parece, foi morta por isso.
O coração de muitos sangra com notícias como estas. Ver pessoas tendo que deixar o País para poder continuar vivendo é ter a certeza de nossos direitos, enquanto seres humanos, não estão garantidos, apesar da constituição. Não estão garantidos, porque tem um grupo que não concorda com as diferenças e prefere os iguais. Como se não houvesse beleza nas diferenças, diversidades e nos detalhes.
Até quando vamos achar que ainda temos o poder de escolha é uma pergunta que deve martelar a nossa mente todos os dias. Diante do que vemos acontecer com o parlamentar e a professora, parece que ser diferente não é problema desde que bandeiras não sejam levantadas, desde que não haja luta por respeito e dignidade às minorias.
Fim do ano passado li uma matéria de cinema, que terminava com a seguinte frase: “o pensamento crítico é a cura para estupidez”. Escrita pelo jornalista  Eduardo Cavalcanti, essa frase – aliada aos acontecimentos registrados neste texto, traz uma ampla reflexão: a quem não interessa que sejamos críticos? A quem não interessa que deixemos de ser estúpidos?
Lutar pelos diferentes tem se mostrado cada dia mais perigoso, assim como é pensar. Aceitar que não existe uma verdade única num lugar de diversidades pode custar a vida. Custou a da Marielle. Jean e Débora lutam para que não custe as deles.
Enquanto isso, mais uma barragem se rompe, matando pessoas. Índios são massacrados por lutarem por suas terras. O descaso persiste. A dor dos cidadãos aumenta. Que história este País está escrevendo, senão uma marcada por intolerância e mortes.
O Brasil, que já foi chamado de País do futuro, vive o retrocesso numa guerra não declarada, em que os mortos e feridos são as minorias. O futuro cobrará caro por um momento como este.

  • Texto escrito por Flávia Souza, jornalista e CEO da Spiraal Comunicação Inteligente



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